sexta-feira, 15 de abril de 2011

O verão lá fora

Ele tem uma mania de dormir bonito. Não ronca nem sequer babinha escorrendo da boca. Pra provar que é de verdade, permite uma remela no canto do olho. Mas ainda mais ou menos acorda e te puxa pra perto, fazendo-te reparar que um braço nunca substituiu tão bem um travesseiro.
E é a beleza da remela no canto do olho que te faz adorar a idéia de desistir do verão lá fora. De calor o seu hálito basta.
Enquanto ele escova o dente, você dá um passo pra trás e imagina que aquelas costas deveriam estar escondidas num lugar do seu quarto pra você tirar de vez em quando. Então você pensa nos olhos, coxa, braço e já não tem mais espaço pra tantos pedaços. Mas você tem ele inteirinho e aceita, por que não?

Porque você conseguiu substituir um braço.
E ele, de costas, indo embora, não te incomoda mais.


Agora quem te acorda é o sol do verão lá fora...

quarta-feira, 9 de março de 2011

Sem borracha.


São 7:50 da manhã de uma quarta-feira de cinzas. Não estou cansada nem de ressaca como 90% da população festiva brasileira e definitivamente não preciso dormir. Não quero dormir, e droga, acabei de ver “Juntos por acaso” duas vezes seguidas e isso me parece muito solitário. Tenho 12 ligações pra retornar - desde provavelmente segunda - de pessoas animadas que prometeram me divertir nesse carnaval. Decidi não atender nenhuma, e minhas janelinhas do msn piscam e reclamam que eu não respondo. Também decidi não responder. A mesa tá uma bagunça, estuo usando a mesma caneca pra tomar sorvete desde ontem, não lavo meu cabelo há quatro dias. Certas pessoas me chamariam de porca, eu fingiria que isso muito me incomoda, mas quer saber? Tomaria sorvete nessa caneca por um mês, junto com meu cabelo sujo e oleoso que isso vai continuar não me importando. Toalhas na cama, calcinha esquecida no banheiro e não dei descarga porque faço xixi muitas vezes de madrugada. Minhas unhas, pra variar, roídas e devo ter germes, é o que dizem. Mas hoje perfeitamente eu sairia assim: sandália, cabelo preso despretensiosamente e cintura perdida no espaço grande de uma camisa confortável. Mas que tipo de mulher seria eu? Onde estão suas unhas grandes e vemelhas, sua bunda e silhueta apertadas num vestidinho, seu brinco grande, o batom? E a espera? Aonde ela está? Porque mulheres vivem numa sala de espera. Horas sentadas naquela ânsia do olhar, do comentário, da passarela. Não, eu não ousaria sair de casa assim. Desonraria a raça da submissão. A raça do frágil ser, que se esparrama nas ruas implorando 'por favor, me repare. Por favor, seja seduzido, me queira, eu preciso disso. Posso ser um pouquinho tola, mas você pelo menos me acha bonita? Você vai me amar? Vai cuidar das minhas incertezas e inseguranças? Olha, sou um bichinho reprimido na palma de suas mãos. Veja só quanta coisa eu fiz pra você me tirar dessa solidão que é não ter nada além de um corpo interessante. Se você me amar, vou ter um corpo interessante e um amor. E vou pensar que você me ama e isso vai me consumir tanto que enfim, vou me sentir mulher. '
E eu, quase um menino, só queria mesmo era poder sair por ai com minha roupa confortável e mandar o cara que não me reparou se danar. Porque eu desprezo do fundo da minha alma mulheres que vivem em função disso.
E se eu não quiser descer até o chão, ainda vou ser mulher? Se meu corpo não for um outdoor ambulante movido a olhares, também? 
Essa mulher quase menino continua assistindo filminho água com açucar e perde o sono por pensar tanto em como a vida seria com os finais felizes. É insegura e tem seus medos, vai precisar que a peguem no colo, que reparem na sua cintura, que percebam que sim, ela é frágil e quer que a ame, mas que deixe-a também ser. Ser além de uma bunda, de um rosto bonito e do próprio prazer. Ser isso que se é quando se descobre o que não foi reparado. 

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Hoje eu decidi não me arrepender.


Você casou com o cara errado. Dez anos insistindo numa relação que simplesmente não se encaixa, mesmo tendo se desdobrado tanto. Desse relacionamento tortuoso, dois lindos filhos e uma reinvidicação na justiça por pensões atrasadas e incompletas.

Lembra-se da festa lá em meados nos anos 90 quando ele te chamou pra dançar e você se encantou com a suavidade das mãos na sua cintura? Ele sequer a conhecia, mas entre uma música e outra sussurrou no seu ouvido que não iria te deixar escapar. Ousadia que a fez tremer as pernas e sentir o coração gritar.  
Na semana seguinte planejavam casa com cerquinha branca, decidiram juntar as escovas de dente e a estrada. Arrebatador, intenso e inconseqüente. Você nunca se sentiu tão viva.

Hoje eu decidi não me arrepender. O que hoje posso chamar de meu, é fruto de pequenas intervenções de diferentes pessoas e momentos. Amigos que hoje parecem tão distantes foram testemunha daqueles tipos de felicidades momentâneas que tanto fazem parte da vida. Amores com quem tantas vezes me fiz em pedaços pra sentir a sensação doce de juntá-los e que tanto fizeram desse meu coração um atleta.

A vocês, o meu álbum de fotos, a minha lembrança, meus momentos de nostalgia e principalmente, o meu não arrepender-se.

domingo, 17 de outubro de 2010

Entrega


Andando pelas tuas ruas, te sinto meu. E com tal sina, me entrego: meus lábios gostam do gosto amargo que é te pertencer.
Beijo tuas esquinas, ponta a ponta. Acarinho tua história e cuido de tuas feridas. Cuidar de feridas seria assim uma prova de amor?
Em troca, quero ouvir tua voz, vinda de que forma for. Grite, cante, me declame uma poesia.
És um amor dos mais inconvenientes. Roubas meu fôlego, brincas com minha tranqüilidade e grudas em minha pele. Tua lama suja não me faz te querer menos.
Cafajeste, diriam os insolentes. Eu diria confuso.
Meu confuso Recife.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

23:37

Agora sim já podes soltar os teus cabelos.
Repara só no que hoje eu li: tudo é apenas uma questão de tempo.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Entre passos e tropeços

O sono faz pesar os olhos, que parecem procurar o tempo inteiro. As curvas andam me interessando muito, mas quando se tem um objetivo, elas só fazem atrasar. Pensei em não pensar nas curvas. Pensei numa objetividade que me desconfortaria os ombros, mas aceleraria os passos. Desisti. Pensei somente em passos. Mais precisamente nos teus. Nos nossos. Me lembrei que costumo andar em diagonal e que geralmente provoco tropeços. Nunca os desejei tanto. Quando eu te achar vou te fazer tropeçar algumas vezes, sim?       

Quando eu te achar não vou acreditar e vou pensar que ainda não achei. Quando eu te achar vou perder as chaves e a cabeça em todas as esquinas. Vou esquecer a parte do dia sem você pra o dia parecer melhor. Vou dar banana pra tristeza e comprar um livro de receitas mas não vou abrir porque eu te achei, então receitas e todo o resto das coisas vão me parecer menos importante do que me encher de você. Quando eu te achar vou pensar que toda música foi feita pra gente. Mas só porque nos achamos e os que se acham costumam pensar num mundo ao redor de duas almas. Poderão até existir almas achadas como as nossas, mas a gente não vai pensar nessa possibilidade. Mas que bobagem! Seremos um pouco tolos, entende? Tolos como esse texto. Mas é que só pensar em te achar faz meus olhos pesarem menos.